Luta contra o tempo: o drama das famílias que viveram dias de angústia à espera de leitos de UTI durante a pandemia no Tocantins

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Filha de paciente idoso que ficou em estado gravíssimo nunca soube a posição em que o pai estava na fila de espera enquanto aguardava um leito de UTI na capital. Em Araguatins, três pessoas da mesma família morreram em um intervalo de sete dias; todos ficaram em um hospital de pequeno porte esperando o início do tratamento intensivo. Órgãos de fiscalização, como o Ministério Público do Tocantins, atuam contra irregularidades e recebem denúncias desde o início da pandemia. Profissionais trabalhando na linha de frente da pandemia
Mylena Ribeiro/Governo do Tocantins/Divulgação
A pandemia no Tocantins completou 1 ano e sete meses e o estado ultrapassou a marca de 222 mil pessoas recuperadas. Agora, com a redução de diagnósticos e hospitais mais vazios por conta do aumento da vacinação, os moradores se sentem mais seguros, porém o cenário nem sempre foi este. Ao longo dos meses, várias situações que colocaram pacientes em risco foram registradas, como desabastecimento de hospitais e longa espera por leitos em Unidades de Terapia Intensiva (UTI).
Pessoas diagnosticadas com a Covid-19, que já estavam em estado grave, ficaram dias aguardando a oportunidade de iniciar o tratamento correto. As situações dramáticas deixaram famílias angustiadas e foram pautas em Ações Civis Públicas.
Mapa mostra variação de casos e mortes por Covid em todos os estados
Em março de 2020 a Secretaria Estadual de Saúde (SES) registrou o primeiro caso de coronavírus no Tocantins e quase um mês depois o governo do estado confirmou a primeira morte pela doença. Desde então houve picos de transmissão, hospitais superlotados e graves problemas de saúde pública que afetaram a população.
O aumento expressivo de internações fez o sistema de saúde entrar em colapso no Tocantins. Durante meses houve crise e quase 100% dos leitos de UTI da rede pública ficaram ocupados. Até quem procurava atendimento em hospitais particulares enfrentava dificuldades.
Pacientes morreram esperando vagas e ambulâncias para transferência entre hospitais. A situação caótica se estendeu por meses e, desde o início da pandemia, o Ministério Público do Tocantins (MPTO) realizou fiscalizações para combater irregularidades, incluindo a falta de transparência. Relembre casos abaixo
Até esta segunda (18) o estado já contabilizava 226.857 diagnósticos da doença. Do total de casos, 3.834 pacientes não resistiram ao vírus e acabaram morrendo.
Fila de espera por leitos
Os altos índices de transmissão da doença agravaram a situação epidemiológica dentro dos hospitais. Com mais pacientes do que a quantidade de leitos disponíveis, doentes precisavam aguardar até as macas serem desocupadas. Por muito tempo a fila de espera pelo tratamento em UTI preocupou famílias de pacientes e piorou quadros clínicos.
O governo do Tocantins disse que “desde o início da pandemia tem trabalhado arduamente para garantir os atendimentos à população tocantinense” e que “todos os esforços foram e seguem para garantir os insumos e profissionais necessários para os atendimentos nas mais diversas regiões do estado”. Veja abaixo a nota na íntegra
Gráficos do dia 13 de março de 2021 mostram ocupação de hospitais do Tocantins
Reprodução/Integra Saúde – SES
A corretora de imóveis Nayara Soares contou ao g1 que ficou angustiada enquanto o pai dela esperava por um leito. Em março deste ano, quando os hospitais estavam superlotados, Luiz Roberto Soares que tem 64 anos e é professor de natação, ficou internado na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Norte de Palmas mesmo precisando de um tratamento intensivo.
A filha conta que nunca soube quando o pai foi inserido na lista de espera e que constantemente era informada que uma vaga tinha surgido, mas logo depois profissionais de saúde diziam que a transferência tinha sido adiada porque o leito já estava ocupado.
“A pessoa ficava internada lá e, se melhorasse, ia pra casa. Se piorasse tinha que ir pro hospital porque na UPA era só iniciação do tratamento. Passaram os dias e ele teve pioras. Me falaram que tinham conseguido uma vaga e que ele seria transferido para um leito clínico do Hospital de Campanha, mas ele piorou ainda mais e precisou de UTI. Lá estava um caos. Ele na fila há dias, mas a gente não tinha ideia de quando a vaga dele ia aparecer. Falavam que surgia a vaga e, de repente, não tinha mais. Isso aconteceu com várias pessoas”, contou Nayara.
O paciente foi transferido mais de uma semana após dar entrada na UPA. A espera do pai de Nayara foi antes do Estado ser obrigado a divulgar informações sobre a fila para leitos clínicos e de UTIs Covid.
Em março deste ano a 27ª Promotoria de Justiça da Capital apurou que havia divergência nos dados divulgados pela SES. Apesar do Integra Saúde, portal do governo que monitora a situação do coronavírus no estado, informar que existiam leitos livres em hospitais, o MPTO recebia denúncias de que pacientes estavam à espera de vagas.
Foi então que a promotora Araína Cesárea D’Alessandro, que atua na área de defesa da saúde pública, denunciou a falta de transparência e solicitou que a Justiça obrigasse o Governo do Tocantins a divulgar, na internet, a lista de pacientes que aguardavam leitos. Os dados passaram a ser disponibilizados no fim do mesmo mês, após decisão do juiz Gilson de Araújo Correia. O sistema online registra o número de identificação do paciente, a cidade de origem, além da data e horário em que a pessoa foi incluída. Acesse aqui
Promotora Araína D’Alessandro explica como MPTO atuou durante a pandemia no Tocantins
“O Ministério Público buscou atuar na pandemia, desde o início, com a elaboração do plano de contingência, com elaboração de toda uma gestão, havendo planejamento, transparência, na ampliação de leitos, no fornecimento de equipamentos de proteção individual, de medicamentos e também para que houvesse, além da transparência, a impessoalidade na gestão. Para que houvesse uma regulação aos pacientes que precisassem de leitos clínicos e leitos de UTI e que essa regulação fosse impessoal e célere. Ocorre que no desenrolar da pandemia o Tocantins chegou a alguns momentos de falta de leitos. Essa falta gerou uma fila de espera e uma demanda de pacientes, e eram pacientes muito graves, que precisavam de um atendimento urgente”, lembra a promotora.
Araína explicou que muitas famílias começaram a procurar ajuda. “Esses pacientes procuraram, obviamente, os órgãos de defesa à saúde para judicializar suas ações e ter direito a defesa da saúde e da vida. Nós, assim como o poder judiciário, precisávamos saber como estava essa fila de espera, essa regulação, e não tínhamos transparência em relação a isso”, informou.
A promotora disse que mais que os órgãos, a sociedade precisava ter acesso às informações da fila de espera. “Saber efetivamente quantas pessoas estariam esperando, qual a posição de cada uma, até para que o dimensionamento da ampliação dos leitos fosse de acordo com a demanda daquele momento conforme a dinâmica da pandemia. A sociedade precisa conhecer esses dados até para se comportar, evitando aglomerações e adotando as medidas preventivas”, comentou Araína.
Ela explicou que se baseou nos princípios constitucionais da publicidade e da transparência e também na lei estadual que já previa a publicação da fila de espera para as cirurgias eletivas.
“A informação é fundamental. Durante todo esse tempo a saúde pública passa por vários problemas no Brasil. Um dos que mais afligem o cidadão é a falta de informação e de conhecimento. Que porta ele vai bater, qual o caminho ele vai percorrer. Quando a pessoa está fragilizada e tem acesso a essa fila de espera é ter acesso ao que há de mais caro para a edificação da cidadania, que é a informação de como está o andamento do seu direito que não está sendo garantido naquele momento. Existem providências que estão sendo tomadas para implementar o direto à saúde e o direito à vida porque não existe direito à vida se a saúde não estiver garantida”, disse.
Nayara, que ainda acompanha a recuperação do pai, acredita que a transparência ajuda famílias em situações desesperadoras. “Era importante saber a posição dele na fila, até amenizava o desespero e a gente teria mais informações. Foram muitos dias sem o tratamento necessário. Se não fosse isso [os dias sem tratamento] talvez hoje ele não teria sequelas”, disse.
O professor de natação continua fazendo acompanhamento com cardiologista e pneumologista e ainda está afastado do trabalho.
Luiz Roberto Soares venceu a Covid e comemorou aniversário de 64 anos
Arquivo pessoal
O médico infectologista Marcelo Daher explica que o paciente que se submete mais rapidamente ao tratamento correto tem mais chances de não ficar com sequelas.
“É muito importante, frente a um diagnóstico positivo de Covid, principalmente as pessoas idosas, com comorbidades ou que estejam com sintomas muito intensos, que elas procurem atendimento médico. Nesse caso, se houver necessidade de internação, que ela seja feita”, disse o especialista.
Infectologista fala sobre a importância de tratar a Covid-19 rapidamente
Três mortes em sete dias
A família da técnica em laboratório Sueli Freitas Barros viu falhas no atendimento acontecer três vezes. O pai dela, Raimundo Batista Barros, e duas tias, incluindo a liderança quilombola Maria de Fátima Batista Barros, que era uma das principais vozes do movimento quilombola e negro do Tocantins, morreram após ficarem dias lutando contra a doença e contra a falta de recursos na saúde pública do Tocantins. Em todos os casos a Justiça foi acionada por causa da falta de leitos.
Os três moravam em Araguatins, na região do bico do papagaio, e os irmãos eram quilombolas da Comunidade da Ilha de São Vicente, que fica às margens do rio Araguaia. A família conta que nenhum soube da morte do outro. Isso porque todos precisaram ser intubados por conta do tratamento da doença.
Raimundo Batista Barros e Maria de Fátima morreram por Covid-19
Divulgação
Sueli, que ainda sofre com as perdas, diz que todos ficaram internados no Hospital Municipal de Araguatins, unidade de pequeno porte, enquanto vagas em hospitais de referência eram liberadas.
“Foram dias angustiantes. Primeiro foi com a Fátima. Ela estava no hospital de Araguatins, mas tinha que ser transferida porque o hospital daqui não podia mais fazer nada por ela. Só que não achávamos vaga em lugar nenhum e entramos na Justiça. Ela ficou três dias aguardando até que surgiu um leito clínico, mas ela já precisava de UTI”, lembra Sueli. No dia 19 de março ela deu entrada na UTI do Hospital Regional de Augustinópolis.
Enquanto isso o Raimundo, irmão de Fátima, também adoeceu e precisou de uma transferência. Ele procurou atendimento médico em Araguatins, no dia 22 de março, por causa de dores de cabeça que não cessavam. No Hospital de Araguatins os médicos já identificaram que a respiração do paciente estava comprometida e ele começou a fazer uso de oxigênio.
Dias depois conseguiu o leito que precisava. Primeiro ele foi internado em um  leito clínico no Hospital de Doenças Tropicais, em Araguaína, onde foi intubado, mas por causa da gravidade do quadro, Raimundo foi transferido para um leito de UTI no Hospital Regional da mesma cidade. A morte de Raimundo foi comunicada à família no dia 30 de março. “Foi só sofrimento. Ele é idoso e viajou sozinho naquelas condições. Acabou que teve um final triste”, disse Sueli.
Uma semana depois Fátima Barros também morreu e cerca de quatro horas mais tarde uma tia dos irmãos, Angélica Arcanja, de 77 anos, também não resistiu. Os corpos das duas foram enterrados no Cemitério Municipal de Araguatins durante a mesma cerimônia.
Dias antes de morrer, quando ainda estava com sintomas leves da doença, a liderança quilombola contou ao g1 como era ter que conviver com o vírus e ter ficar isolada. Na época, sem imaginar que passaria pela situação, ela disse que tinha começado um novo projeto e tinha esperança de viver dias melhores.
“A gente clama por uma saúde pública que seja mais digna. Que os números de vagas sejam ampliados e que a gente possa enfrentar isso com dignidade. Que a saúde seja um direito de todos”, contou Fátima que tinha 48 anos e não possuía nenhuma comorbidade.
A morte de Fátima Barros, que dedicou a vida a defender povos tradicionais e foi a primeira da família a frequentar uma universidade, gerou comoção nas redes sociais. Ela foi homenageada por familiares, amigos, autoridades, além de diversos coletivos de lideranças quilombolas e também do movimento negro.
Maria de Fátima Batista Barros era uma das principais lideranças quilombolas do Tocantins
Arquivo pessoal
Especialistas no tratamento do coronavírus afirmam que muitas mortes poderiam ter sido evitadas se o atendimento correto estivesse ao alcance de todos. O infectologista Marcelo Daher explicou que o tratamento adequado é extremamente importante.
“Você ter um médico de referência, leitos disponíveis, poder ter medicamentos e capacidade de intervenção rápida faz muita diferença em um paciente com Covid-19. A demora no atendimento pode fazer com que o paciente chegue tarde demais no hospital e os recursos serem muito poucos. Pode fazer diferença entre a vida e a morte”, disse o especialista.
Pacientes mortos durante longa espera
Muitos pacientes graves morrem antes mesmo de chegar ao leito solicitado pelo médico. Conforme os dados da Secretaria de Saúde, mais da metade dos casos de Covid-19 se concentra no interior do estado, onde não há leitos de UTI. A demora na transferência dos pacientes para as principais cidades já colocou muitas vidas em risco. Alguns óbitos registrados no Tocantins são de pessoas que estavam em salas de estabilização esperando até mesmo a chegada de uma ambulância.
Foi o caso de Francisco Pereira, de 68 anos. O idoso passou as últimas horas de vida sentado em uma cadeira no hospital público de Pedro Afonso, com dificuldades de respirar. Depois de muitos dias aguardando uma vaga, ele conseguiu um leito de UTI em Araguaína, mas na hora da transferência faltou uma ambulância.
O paciente não resistiu e morreu na cadeira do hospital.
“Procuramos vaga para ele em Palmas, disseram que não tinha. Procuraram vaga para ele em Araguaína e também não conseguiu. Me falaram que iam fazer exame nos pulmões dele e aí disseram que tinha arrumado uma vaga em Araguaína, mas não tinha a UTI móvel, não tinha o carro para levar ele”, relatou o filho Edson Silva na época.
Idoso morreu em cadeira do hospital público de Pedro Afonso enquanto aguardava transferência para UTI
Reprodução/TV Anhanguera
Houve casos de pessoas com coronavírus morrendo em UPAS, onde esperavam a transferência para um hospital com mais recursos. Edilma da Silva Goulart tinha 49 anos quando começou a apresentar quadro grave da doença. Sem leitos disponíveis em Palmas, ela ficou quatro dias aguardando a liberação de uma vaga.
Na época o MPTO chegou a conseguir uma liminar determinando a transferência, mas a mulher morreu antes de conseguir um leito. O pedido de UTI foi protocolado pelo promotor Vinícius de Oliveira às 18h45 e a uma liminar foi expedida pelo juiz Gilson Coelho Valadares às 21h03. Mesmo com todos os esforços, a transferência não foi feita a tempo.
Um áudio divulgado pela família da paciente mostra que Edilma Goulart estava com medo de morrer na unidade. (Ouça no vídeo abaixo)
“Levaram todo mundo e me deixaram. E eu tô passando muito mal. Chama um bocado de gente meu Deus, vê essa assistente social pra me mandar hoje. Eu vou morrer, Luana”, disse a paciente em um áudio.
A filha da paciente citada no áudio, Luana Goulart, conta que percebeu que a mãe estava com a voz diferente. “Percebi ela bem ofegante, bem cansada”, disse.
Paciente morre vítima da Covid-19 após 4 dias esperando transferência para UTI
Quando a família acionou o MPTO foi proposta uma ação e, em menos de duas horas, o juiz atendeu ao pedido. Ele disse na decisão que “a falta de vaga na UTI no hospital público, não pode impedir que o Estado do Tocantins viabilize o tratamento da idosa em um estabelecimento hospitalar privado” e reforçou a “necessidade da paciente ser imediatamente transferida para uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de hospital particular nesta capital”. Ele finalizou informando que “se isso não vier a ocorrer com devida urgência o risco de morte é muito presente”. Foi o que aconteceu. Quando o oficial de justiça chegou na UPA com a decisão já era tarde demais.
O companheiro de Edilma disse que o quadro de saúde da mulher era delicado e ela devia ter sido transferida rapidamente. “Ela ficou quatro dias lá. Sabiam que estava debilitada, tinha que ser uma das primeiras a sair de lá [UPA]. Minha mulher morreu à míngua”, disse o pedreiro Carlos Goulart.
João Nonato Assunção ficou na fila de espera por UTI no hospital de Porto Nacional
Arquivo Pessoal
Em Porto Nacional, João Nonato Assunção de 70 anos ficou dias na fila por um leito de terapia intensiva para tratar a Covid-19, mas evoluiu para óbito horas após conseguir a transferência que precisava. Desesperada e sem poder entrar na unidade em que ele estava internado, a filha Kaline da Paz fazia vigília para acompanhar o pai pela janela do Hospital Regional de Porto Nacional.
A mulher já tinha perdido um irmão para a doença de forma semelhante. Ele também precisou ser transferido para uma UTI e morreu 15 minutos antes da chegada da ambulância que faria a transferência.
“Eu tô aqui dormindo na porta do hospital sozinha porque eu estou desesperada com o meu papai. Ele tá ali naquela janela, ele não fica sem mim, ele chora. Eu queria estar lá cuidando dele. Eu tô desesperada, precisando de ajuda. Eu não quero que meu pai morra por causa de UTI. Meu irmão já morreu. Ele não merece isso. Eu estou muito indignada, de não conseguir ajuda. Eu preciso de ajuda, pelo amor de Deus. Eu não quero que meu pai morra”, lamentou Kaline na época.
A morte João Nonato Assunção foi comunicada à família no dia 13 de março.
Um mês depois o Estado criou 10 leitos de UTI no Hospital Regional de Porto Nacional, onde o paciente estava. A instalação foi feita após determinação da Justiça.
Desabastecimento
UPAs de Palmas têm leitos de estabilização
Raiza Milhomem/Prefeitura de Palmas
A baixa quantidade de leitos em relação aos pacientes e a falta de transparência não foram os únicos problemas que afetaram o Tocantins. A promotora Araína informou que em alguns momentos faltaram remédios indispensáveis para o tratamento de pessoas com coronavírus. A situação colocou em risco a vida de centenas de pacientes no Tocantins.
“Em relação ao município de Palmas, nas Unidades de Pronto Atendimento, houve Ação Civil Pública quando a questão de protocolo, a oferta de oxigênio e medicamentos. Em relação ao estado posso pontuar anestésicos e sedativos aos pacientes com Covid que precisam muito deste tipo de medicamento”, afirmou a promotora.
No dia 25 de março mais de 10 pacientes com coronavírus que estavam internados na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Norte, em Palmas, precisaram ser transferidos às pressas após o local ficar superlotado. Na época a Secretaria Municipal da Saúde (Semus) disse que a medida foi tomada para evitar a sobrecarga que poderia ocasionar a falta de oxigênio.
Por causa da falta de itens de extrema necessidade, como os chamados kit intubação, leitos de UTI públicos precisaram ser bloqueados inúmeras vezes mesmo durante a existência de filas de espera por vagas. Nesses casos, por uma questão de segurança, os leitos ficavam desocupados para garantir insumos e medicamentos para os pacientes já internados. A situação deixou, por várias vezes, famílias desesperadas.
Durante a pandemia, vistorias realizadas no Hospital Geral de Palmas, maior unidade de saúde pública do Tocantins, constataram escassez de sedativos, anestésicos utilizados na intubação de pacientes e anticoagulantes.
Vistoria realizada no HGP em junho de 2021 flagrou pacientes em corredores e falta de materiais
O infectologista Marcelo Daher, que já tratou pacientes com coronavírus, afirma a falta dos remédios e insumos pode agravar o quadro de saúde, podendo levar à morte.
“A falta de recursos dentro de um hospital também pode ser um problema. Se não tivermos a equipe, equipamentos e a estrutura montada, nós teremos um problema. Essas três partes são importantes para que a gente consiga fazer um atendimento adequado e dê uma resposta rápida ao paciente”, pontuou.
Irregularidades na vacinação
Vacinação no Tocantins está liberada para quem tem 12 anos ou mais
Raiza Milhomem/Prefeitura de Palmas
Ao longo da pandemia foram investigadas denúncias de pessoas furando fila na vacinação da Covid-19, possíveis situações de favorecimento no Tocantins e irregularidades relacionadas ao armazenamento indevido de doses. Durante vistorias realizadas pelo MPTO em cidades do interior do Tocantins foram encontrados frascos com doses congeladas.
“O Ministério Público atuou em duas esferas: tanto no campo da improbidade administrativa quando no campo criminal. Nós tivemos casos no interior e na capital. Paralelo a isso começamos a realiza inspeções físicas nos municípios […] e nós levantamos algumas situações de perdas de vacinas, situações graves, de congelamento de vacinas por falta de termômetros, situações de falta de planejamento com esse bem tão precioso para o enfrentamento da pandemia. Orientamos secretários municipais de saúde”, disse a promotora Araína.
A vacinação de Rainel Barbosa Araújo, ex-prefeito de Miracema do Tocantins, foi alvo de críticas de moradores e foi investigada pela Secretaria Municipal de Saúde. É que ele tinha 59 anos, estava fora de grupos prioritários e se vacinou antes da hora. O ex-gestor usou as redes sociais para comemorar o recebimento da primeira dose da AstraZeneca.
Na época estavam sendo vacinados pessoas com mais de 60 anos. Moradores denunciaram que no mesmo dia que o ex-prefeito foi vacinado muitos idosos, público alvo da campanha, deixaram de receber o imunizante por causa do baixo estoque de doses.
Rainel Barbosa nasceu no dia 4 de junho de 1961 e ainda faltavam 42 dias para que ele completasse 60 anos. Procurado pelo g1 ele disse que foi chamado a um posto de saúde para receber a vacina e acredita que foi vacinado por ter pressão alta e problema no coração, o que o obriga a usar um marcapasso.
Ex-prefeito de Miracema do Tocantins foi vacinado contra o coronavírus
Divulgação
Também são investigados casos de pessoas que tomaram três doses de vacina contra a Covid. As aplicações foram antes do Ministério da Saúde informar da necessidade do reforço para pessoas de grupos prioritários.
Os dados do vacinômetro, portal que monitora a imunização no Tocantins, mostram que o estado recebeu 2.163.885 doses de vacinas do Ministério da Saúde, sendo que 2.121.236 foram distribuídas aos municípios e 1.619.864 já foram aplicadas.
São 1.004.535 referentes a aplicação de primeira dose, 565.467 da segunda dose da vacina e 31.563 da dose única. A atualização foi feita nesta segunda (18), às 10h02.
Como formalizar uma denúncia
Situações de irregularidades podem ser denunciadas de forma gratuita e facilitada ao MPTO. O órgão registrou aumento de 153% no recebimento de denúncias em 2021, se comparado com o mesmo período do ano passado. Segundo o órgão, manifestações sobre problemas na área da saúde estão entre as mais comuns, ficando atrás apenas de casos de improbidade administrativa.
A procuradora de Justiça Leila da Costa Vilela Magalhães, ouvidora do MPTO, acredita que a situação epidemiológica decorrente do coronavírus pode ter contribuído para o aumento expressivo.
Para que moradores de todo o estado tenham acesso seguro ao Ministério Público, o órgão disponibilizou atendimento remoto por vários meios de acesso. É possível formalizar denúncias sem precisar sair de casa. Os canais são os seguintes:
Chamadas gratuitas pelo telefone 127
Através do e-mail denunciacovid@mpto.mp.br
Por mensagem de celular pelo WhatsApp (63) 99100-2720
Pelo site mpto.mp.br/web/ouvidoria, no link ‘manifestação’
Contatos regionais para agendamento; veja lista
Denúncias sobre saúde pública e outras áreas podem ser feitas pela internet ou por ligações
Reprodução/Site Ministério Público
O que diz a Secretaria Estadual de Saúde
A Secretaria de Estado da Saúde (SES) informa que, desde o início da pandemia tem trabalhado arduamente para garantir os atendimentos à população tocantinense, sendo até referência para o Ministério da Saúde (MS), para receber pacientes de outros estados, em colapso durante a pandemia.
A SES enfatiza que mesmo com o declínio dos números da pandemia, ainda mantém a maioria dos leitos de tratamento exclusivo para Covid-19. Todos os esforços foram e seguem para garantir os insumos e profissionais necessários para os atendimentos nas mais diversas regiões do Estado.
A SES pontua que mesmo com um cenário de escassez de material e insumo, bem como de oxigênio em grande parte do país, o Tocantins manteve todas as unidades geridas pelo Executivo Estadual, devidamente abastecidas para as demandas existentes.
A Prefeitura de Palmas também foi procurada para comentar a situação, mas ainda não se posicionou.
Veja mais notícias da região no g1 Tocantins.

Fonte: G1 Tocantins